Tuning na aldeia global
Agosto 12, 2009
Aqui há uns anos, alguém inventou um chavão que pretendia traduzir o encurtamento das distâncias, a proximidade dos países e populações, a facilidade de comunicações, de trocas comerciais e por aí fora. Dizia-se que vivíamos numa aldeia global. Estava tudo à mão, conhecíamo-nos todos, era tudo belo.
Prova disso (ou não) foi o que se passou com um dos tunings que quisemos fazer à casa nova.
Ao contrário da conduta para a roupa suja, a decisão de instalarmos desumidificadores de parede nas casas-de-banho estava tomada há muito, muito tempo. Na altura, fiz uma pesquisa rápida pelo Google e, ao encontrar alguns modelos à venda no estrangeiro, apercebi-me que não íamos inventar a roda. Era uma questão de aprofundar as pesquisas e contactar as grandes lojas de electrodomésticos portuguesas ou, quanto muito, os representantes das marcas.
Quando chegou o momento de finalmente comprar os ditos (porque precisávamos dos aparelhos para fazer as marcações de saída de água e entrada de corrente eléctrica), o desconsolo foi total. Ninguém, em Portugal, vendia desumidificadores de parede. Pior: nem sequer sabiam que isso existia e ainda nos tentaram impingir os tradicionais (“Ah, mas este tem rodas e tudo!”).
Abandonámos então as lojas e virámo-nos para as marcas. Encontrámos uns alemães com representação em Portugal, a quem enviei um mail, a pedir informações. Depois de ter esperado o tempo que acho razoável para alguém responder a um mail, o marido telefonou para lá. Atendeu-o um grunho que disse que não vendiam isso e nunca tinham ouvido falar.
Como sou um bocadinho teimosa, resolvi contactar, também por mail, a sede da marca na Alemanha, expor o caso e apontar o dedo ao representante deles em Portugal. No dia seguinte, recebi um telefonema de cá, de um engenheiro muuuuito cordial, muuuuito paninhos quentes e muuuuito disponível. Lá lhe fiz o tour pelo site da marca deles até chegar, com grande surpresa por parte do meu interlocutor, ao desumidificador. Alguns dias depois, sempre podiam encomendar da Alemanha. Pedi-lhe que me enviasse um PDF com o manual dos aparelhos e o orçamento dos ditos.
Entretanto, tivemos um súbito ataque de felicidade: descobrimos que o El Corte Inglés em Espanha vendia o que queríamos! E como para nós, bimbos, o El Corte Inglés é sempre o El Corte Inglés, seja em que parte do mundo for, pensámos logo que a nossa vida tinha ficado imensamente facilitada: encomendávamos em Lisboa, os aparelhos vinham de Espanha para Lisboa e nós íamos buscá-los a Lisboa.
Wrong.
Muito wrong.
O El Corte Inglés em Portugal NÃO comunica com o El Corte Inglés em Espanha. Sim, é estúpido. Sim, eu também não acreditei.
O único favor que consegui foi fazê-los telefonar para Badajoz a perguntar se tinham em stock. E não tinham. E a loja de Lisboa também não podia encomendar por nós, mesmo indo nós depois ter com nuestros hermanos.
Bom, pensámos, vivemos numa aldeia global, portanto, nem tudo estava perdido. O El Corte Inglés espanhol faz vendas online, encomendava-se assim.
Mais uma vez, wrong.
Encomendava-se online e pagava-se o dobro, por causa dos custos de transporte. E esperava-se um mês (aparentemente, os nossos conhecimentos de geografia estão errados e Espanha é muito, muito longe).
Regressei aos outros sites estrangeiros onde tinha visto o desumidificador à venda e a situação ou era idêntica ou então nem sequer faziam entregas para Portugal (se calhar, Portugal é que fica muito, muito longe….)
Mais ou menos por esta altura, recebi do tal engenheiro muuuuito cordial, muuuuito paninhos quentes e muuuuito disponível o orçamento dos desumidificadores alemães. Ui. Era para esquecer. E isto para não falar do “Se houver algum problema, não podemos dar garantia… sabe como é… isto vem de fora…”. Ainda estive para perguntar “De fora, de onde? Marte?”, mas desisti.
Numa última tentativa, agarrei nas rédeas da situação com toda a genica que ainda me restava e depois de uns mails para o call center do El Corte Inglés espanhol (em que a todas as minhas perguntas responderam com “Es necesario que contacte la Tienda, es necesario que contacte la Tienda!”, liguei para Badajoz e pedi socorro.
A salvação chegou imediatamente, na forma de uma senhora chamada Isabel e a quem até hoje agradeço com vinte vénias de cada vez.
(Isabel, se algum dia leres isto, gracias, gracias, gracias!)
A Isabel percebeu em três minutos o que pretendíamos (mesmo eu falando portunhol), pediu-me o número de telefone e desligou. Contactou todos os El Corte Inglés de Espanha para saber se tinham o desumidificador em stock. Não tinham. Ligou para o armazém e encomendou. Ia demorar uma semana a chegar, mas demorou dois dias. Em todas as etapas deste processo, telefonou-me para me deixar a par do que se estava a passar. No sábado seguinte, metemo-nos no carro logo pela manhã e fomos a Badajoz. Com muita pena minha, não vi a Isabel (só entrava à tarde), mas os aparelhos estavam lá à nossa espera. Chegámos a casa às quatro da tarde, com a bagageira cheia e eternamente gratos à Isabel dos pequeños electrodomésticos.
Apesar de toda esta aventura (ou se calhar por causa dela), estamos desejosos de ver os desumidificadores instalados e a funcionar.
Como dizia no princípio, sim, vivemos mesmo numa aldeia global. E ainda andamos todos de carroça.