Sendo reconhecidamente agnóstica, é-me cada vez mais difícil compreender o Natal.
Este Natal.
Da obsessão pelas compras. Das prendas "à pressão" e sem significado. Dos telefonemas que fazemos apenas nesta altura. Das pessoas com quem estamos apenas nesta altura. Das sms descaracterizadas e em catadupa. Dos chocolates e das garrafas de vinho embrulhadas em papel colorido ou vermelho berrante. Do empanturranço politicamente correcto com doces, filhós e bolo-rei.
Não compreendo e não gosto deste Natal. Sabe-me a obrigações e coisas forçadas.
- Estou cheia de fome… - Tenho ali chocolates, queres? - Não, não… eu agora quero é jantar. - Mas é chocolate preto! - Epá, eu quero é sopa, carne, batatas… - Ah, já percebi… és mais de salgados, não é?
b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a Um (ou dois, ou três, ou até mais, consoante o número de almoços, lanches e jantares tidos) feliz Natal. b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a b l a
O marido foi arrancar um dente o siso e eu preparei-me para vestir a pele de enfermeira a transbordar paciência para um bébé-grande-chorão,-infeliz,-um-bocadinho-hipocondríaco-e-com-a-cara-inchada quando chegasse a casa. Encontrei-o surpreendentemente alegre, a rir, rosto em forma de batata e cantos da boca vermelhos e meio esfolados. De um só fôlego e maxilares semicerrados, com uma compressa enfiada quase até às goelas, contou-me que passou uma hora e cinquenta minutos sentado na cadeira do dentista, que perdeu a conta às radiografias tiradas, que só via sangue, sangue, sangue, que o médico quase se empoleirou em cima dele para conseguir fazer força, que o dente teve de ser partido para sair e, mesmo assim, ficaram uns bocadinhos de raiz (aparentemente inofensivos), que chamaram outro dentista para dar uma opinião
e eu só tenho tempo de me sentar na beira do sofá, o nervo vago a pregar-me uma partida, tudo enevoado, suores frios, as forças a irem-se, o estômago não lanchado a querer sair e
Em 1968, um Professor de seu nome Laurence Johnston Peter formulou uma teoria à qual chamou “Princípio de Peter”. Segundo esta teoria, os funcionários que trabalham sob um sistema hierárquico tendem a ser promovidos até atingirem o seu nível de incompetência.
Quase todos os dias - e nas mais variadas situações - me lembro deste princípio. Quase todos os dias penso que não sou capaz.