Vou ao mercado num dia não habitual. A senhora onde compro sempre os legumes não está. A pedra da bancada foi tapada com panos e há caixas de plástico a barrar a entrada. Dirijo-me à vendedora do lado. A senhora é igualmente simpática, os produtos são igualmente bons. Trago batatas, cenouras, cebolas, uma alface, laranjas.
Iguais aos de sempre (é provável que o fornecedor seja comum). Mas não os mesmos.
Eu não gosto do Natal. E não gosto desde que deixei de ser pequenina, o que já foi há muito, muito tempo.
Este ano, a ausência de espírito natalício atingiu níveis nunca antes vistos. Bateu todas as escalas de Richter e de Mercalli modificada. Mesmo assim, enchi o peito de ar e fiz o Natal. E fi-lo lá em casa. Jantar, com sopa e tudo. E muitas sobremesas. E troca de prendas. E sorrisos e "muito obrigadas" e fotografias. O pacote completo da tradição.
No final da noite, depois de todos se irem embora, sentei-me no sofá. A televisão estava ligada num canal qualquer e havia brasas na lareira.
Cheguei à conclusão que é impossível fazer compras normais durante esta época. Se o leite se acabar, azar. O melhor é esperar que a loucura consumista natalícia passe e, nos entretantos, ir empurrando os cereais com água del cano.
Há quem tenha um termómetro no carro e recorra a ele para dizer a temperatura. Eu não tenho e não preciso. Basta-me bocejar e, pelo tamanho e densidade da nuvem de vapor, sei logo que está mesmo muito frio.