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outros dias

[dia] período de uma rotação terrestre; no plural, existência

É obra!

Julho 06, 2009

Não foi pensada quando dos digladiávamos com as possibilidades e nem na fase de desenho do projecto. Depois, já no local e em situação real, a coincidência de paredes, de recantos e de pilares-que-não-deviam-estar-aqui-e-sim-ali-mais-ao-lado (para além de um treinador de futebol e de um médico, todos temos dentro de nós um engenheiro civil reprimido...) fez acender uma luzinha no sector "já-agora" das nossas mentes: vamos pôr aqui uma conduta para a roupa suja!

E logo saltámos de regozijo com a nossa ideia: acabaram-se as peças perdidas em não sei quantos cestos, as cuecas e os lençóis a rebolar escada abaixo, a meia desemparelhada e infeliz. Era prático mas, acima de tudo, muito, muito fixe.

Google, telefonemas, google, mails, telefonemas, google, páginas amarelas, mails, orçamentos.

Orçamentos. Pois.

Orçamentos escandalosos.

- E agora?
- Desistimos?
- É tão caro...
- ... mas é tão fixe!
- Pois é...
- Fazemos nós!
- Boa!

E toca de comprar só o tubo e "desenrascar" as portas.

Mais google, telefonemas, google, mails, telefonemas, google, páginas amarelas, mails, um mestrado em condutas galvanizadas, um doutoramento em condutas inox, milímetros, espessuras, orçamentos.

Orçamentos aceitáveis.
Encomenda-se.

- Construtas-man, aguenta-te que demora entre uma semana e uma semana e meia a estar pronto.
- Vocês só me desgraçam...

Quatro dias úteis depois, recebo um mail a dizer que posso ir buscar o material.

- Yes, yes, vai ser tão fixe ter uma conduta!

Rebato os bancos de trás e o da frente da minha-coisa-com-rodas-que-me-leva-para-(quase)-todo-o-lado, forro todos os milímetros de tecido com panos, lonas e cartões, saio mais cedo do trabalho e lá vou eu, auto-estrada e portagens fora, em grande expectativa.

- Ohhhh... mas eu queria ir contigo!
- Não podes, Mãe. Não cabes no carro.

Chego ao sítio, logo à primeira e sem GPS, estaciono a minha maravilhosa viatura de interior rebatido e vou aos escritórios. Pedem-me para aguardar, enquanto vão buscar a peça.

Espero.
Espero.
Espero.
Espero mais um bocadinho.
Quando estava quase a esperar mais outro bocadinho, aparece o rapaz do escritório, sem a conduta mas com um telefone na mão, que me passa, dizendo para eu falar com a engenheira.

- Ah, e tal, estava tudo a correr tão bem...
- Estava? O que aconteceu?
- O meu colega não lhe disse? Enganaram-se. Fizeram em galvanizado.
- Galvanizado?! Mas eu pedi inox.
- Pois pediu. Pediu e pagou.
- E agora? Não quero galvanizado. Quero inox.
- Agora temos de iniciar um processo de reclamação, dar baixa do outro e fazer uma nova conduta.
- E quanto tempo demora?
- Tenho de ver com a fábrica, mas hoje já não consegue levar.
- Não? Isso é muito grave. Vim cá de propósito e tenho o construtas-man à minha espera para lhe entregar o tubo. Não pode ser.
- Errrr.... então aguarde um pouco.

Esperei.
Esperei.
Esperei mais um bocadinho.

A engenheira desce lá do poiso dela e leva-me para o escritório. Trocamos umas palavras muito cordiais, eu, ela, os rapazes do escritório, o senhor que faz as entregas (e que não queria, no dia seguinte, ter de se desviar da rota para entregar um mero tubo) e o chefe do sítio todo. Lá convenceram, em troca de alguns rebuçados, um dos técnicos da fábrica a fazer a peça naquele momento.

- E quanto tempo leva?
- Vinte minutos. É rápido.

Uau, pensei. De uma semana a semana e meia para vinte minutos. Isto é que é zipar um trabalho.

Fiquei plantada à porta da fábrica, a ver os trabalhadores saírem e a ouvir marteladas lá dentro. Vinte minutos depois, eis que surge a minha conduta, reluzente e oleada. Que visão maravilhosa!

- Qual é o carro?
- É aquele.
- Aquele?!?!?
- Sim. Esteja descansado que cabe. Eu tirei as medidas!

Abro cinematograficamente a bagageira da minha coisa-com-rodas-que-me-leva-para-(quase)-todo-o-lado (e que só por acaso é um citadino normal) e o tipo faz uma cara de espanto.

- Ah... pois, realmente, com os bancos todos rebatidos...

Metemos o tubo lá para dentro e ainda sobram uns trinta centímetros entre o tablier e a porta da bagageira. Transbordo de orgulho.

- Está a ver? Podia ser maior que ainda cabia!

Agradeço, agradecem-me, despeço-me de todos e arranco.

Não tenho visibilidade nenhuma para o espelho do lado direito e a conduta está um "bocadinho" em cima da manete das mudanças, mas estou tão contente e aquilo é tão fixe que nem penso nisso... até à entrada da auto-estrada. Aí tive mesmo de parar e prender o raio do tubo com uma corda, senão não conseguia engrenar a quinta. Com a carga devidamente acondicionada, arranco novamente e quarenta minutos de trânsito depois, estou na obra. O marido chega logo a seguir. Descarregamos o mono, transportamo-lo até à casa-de-banho do primeiro andar, deitamo-lo em cima de uns tijolos e placas de wallmate e afastamo-nos um pouco, para admirar a coisa.

- É fixe, não é?
- Muito fixe!

Estamos delirantes com aquilo tudo.

- ...
- ...
- ... é tão grande…

 


Mede 400 mm por 500 mm e tem dois metros de comprido. Cabe uma pessoa à larga lá dentro. Na horizontal, parece o túmulo do Tutankamon. As portas de acesso e a forma de colocação entre o primeiro andar e o rés-do-chão ainda são um mistério.

 


Mas vai ser muito fixe!

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